O amor de pai é uma aventura. É como se aventurar por poços abissais, tão escuros como a alma de outrem. É um sentimento um tanto quanto contraditório. Não no sentido sentimento, entende? Esse é imutável, imexível, imaculado, certo. O conflito aparece, na verdade, nas esperanças do próprio pai. Na verdade que nós mesmos acreditamos como verdade. Nós – pais – damos, mas vamos cobrar ali na frente. Pode ter certeza. De uma maneira sutil, paternal, às vezes um tanto obscura – na maioria das vezes pra nós mesmo -, mas vamos.
Precisamos desse sentimento, que nos alimenta e nos impulsiona. Nos cobre de glórias e infortúnios. Dá tanto trabalho...mas temos que amar. Somos pais. Mas a vida, ah essa vida bandida, teima em nos pregar peças quando mais estamos despreparados, quando estamos olhando para o outro lado. Quando estamos de guarda baixa.
E aí, só nos resta aprender. Mesmo que ainda não nos tenha sido ensinado. Aprender a amar um filho especial, homossexual, maravilhoso ou transviado, bem-sucedido ou acomodado. Aprender a amar aqueles que eles próprios vão amar, mesmo não sendo o nosso amado ou preferido.
O amor de um pai não se exaure, repousa. Não muda, se transforma. Os livros nos ensinam como trocar fraudas, como ajudá-lo a ler aos seis anos, que eles – os filhos – procuram limites dos pais. Mas nenhum nos dá a mínima noção do amor extremo. Dedicado. Ilimitado. Cansativo. Singular. Nenhum. E aí, como lidar com esse sentimento? Que teima em não sair mais do seu coração, das suas entranhas. Da sua vida.
Um dia, ouvi – em uma conversa fortuita – um filho que já era pai dizer: “Meu pai foi muito duro comigo. Não esteve muito comigo, mas hoje eu vejo como foi importante para mim esse limite”. Meu Deus...ninguém nos disse que os filhos crescem. Um dia. Sem a sua permissão. No máximo, você tenta mostrar a direção que acha certa. Mas, quando você se dá conta...um abraço. Não tem mais a cadeirinha da bike para ir à escola ou à pracinha. Nada mais de beijinho na boca. Pedir ajuda para descer da mesa de 50 cm quando ele já tem um metro? Não mais. E os desenhos animados, cujas músicas não saem da cabeça por anos, martelando como um lembrete que sua filhotinha está ali, lindinha, pequena, precisando de você para se divertir com a Puca ou com o backardigans. Saem de programação. Como uma tela preta.
Aí, sem mais nem menos, percebemos que outras pessoas entraram em suas vidas, que antes pertenciam a nós, pais. Nos transformamos em motoristas da balada e rezamos a santos que nem sabíamos que conhecíamos para que eles voltem sãos e salvos. E vemos, sem nenhuma estribeira, as fraldas sendo substituídas pelas calças jeans. As bolsas que abrigavam confortavelmente os ades de frutas e soja e os biscoitos sortidos por mochilas onde repousam os ipods e ipads do século XXI.
E essa mudança frenética vai esbranquiçando os cabelos e moendo nossas hérnias. Mas a dor mesmo vem da certeza de que isso também passa. Nossos filhos estão indo embora, namorando, casando, assumindo o controle. Assim como fizemos um dia. E bate à nossa porta uma dúvida tão cruel quanto verdadeira. Valeu à pena ensinar tanto limite? O preço não foi alto demais? Ficar longe.
Será que abraçamos nossos filhos tantas vezes quanto deveríamos? Será que não deveríamos tê-los coberto na cama mais vezes? Deixado de ver nossos amigos para vê-los em casa acordados? Quem garante que mimamos nossos filhos o suficiente para assegurar-lhes a felicidade plena. Se é que ela existe. Por que não deixamos que eles comessem mais nuggets nos almoço, ao invés de empurrar-lhes brócolis insosso? Tenho a nítida impressão que chegarei mais lá na frente com a certeza de que, ao invés de gritar com minha filha, deveria tê-la deixado dormir mais vezes na minha cama. E sem escovar os dentinhos. Que deveria ter comprado mais revistinhas na banca da esquina, ao invés de ter mentido que não tinha uma mísera moeda. Só para ensinar-lhe que ela não pode ter tudo a tempo e a hora. Não pode por quê? Por que a vida é assim? Ora...
Por que não exercitei na minha filha todo o amor que tenho aqui dentro? É o que vou me perguntar.
Desculpem o desabafo e as linhas mal traçadas. Não foram escritas com o teclado, mas com o coração.
terça-feira, 2 de agosto de 2011
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